#000426 – 16 de Janeiro de 2021

Tinha 10 anos e aprendi a programar. Não sabia que se chamava programar. O timex, compatível com os zx spectrum, vinha com BASIC. As teclas tinham, além das letras, alguns comandos: “GOTO” no G, “DRAW” no W, “LOAD” no J. Sem ter acesso a internet nem manuais, consegui aprender sozinho a fazer um jogo do galo. Foi o meu maior sucesso na programação. A partir daí tudo foi mais difícil, menos intuitivo e deu mesmo lugar a uma grande desilusão. Com 12, 14 anos seria um adepto de Ray Kurzweil, se escutasse o seu optimismo digital. Mas quando fui de facto estudar programação e estive exposto aos computadores, apercebi-me que o bug é uma feature. Muito mais tarde, Gödel e Turing confirmaram-me: os sistemas computacionais são coisas imprevisíveis; antes de correr um programa, não há nenhuma forma de saber se irá funcionar, crashar ou correr eternamente. Em miúdo acreditava que os bugs eram fruto de uma ciência de computação ainda pouca desenvolvida, que os computadores do futuro seriam como no Star Trek: tão fiáveis que lhes confiamos a vida, capazes de nos desintegrar e enviar a informação das nossas moléculas para outro lugar, em seguro teletransporte. Mas sei agora, nunca um computador será um sistema seguro e fiável. Faltam pouco mais de 24h para começar a trabalhar no meu novo emprego e ainda não tenho internet a funcionar corretamente em minha casa. Mais de duas décadas depois do ano 2000, a tecnologia ainda não é a coisa fiável que a ficção do século vinte projectava. Posso nem sequer conseguir ter uma ligação à internet, mesmo se tenho fibra, um router e um computador novos e tudo esteve a funcionar bem nesta casa durante vários anos. Quando mais precisava, porque vou começar a trabalhar em casa, a tecnologia é de novo a causa de instabilidade ou, usando a palavra favorita dos senhores feudais atuais, de disrupção.