Refém do Kindle

Eu uso o Kindle há muito tempo. Comprei o meu primeiro no início da faculdade e o único modelo disponível até então, era o Kindle com botões físicos, sem touch e sem iluminação. Não me lembro se já existiam os concorrentes do e-reader da Amazon no Brasil, o Lev (vendido pela Livraria Saraiva) e o Kobo (pela Livraria Cultura). Provavelmente sim, mas reconheço que fui pelo comodismo de ir numa marca referência em leitores digitais e seu catálogo imenso. Mas agora, estou preso nela.

Eu não odeio o Kindle. Já mudei algumas vezes de modelo até agora. Amo sua praticidade, seu tamanho (embora queira uma tela maior, olá modelo novo), as boas funcionalidades e o fato de ser apenas um leitor de livros, sem distrações e sem pop-ups de notificações. Adoro o fato de poder comprar qualquer livro facilmente (quando está num preço adequado ou grátis), emprestar alguns pelo Kindle Unlimited ou adquiri-los de forma paralela (vocês sabem como). O problema é que toda a minha leitura digital está somente ali. E até quando?

Tirando os livros adquiridos por outros meios, eu não possuo nada ali. Meus livros comprados não são meus (a não ser que eu faça um procedimento o qual nunca procurei a fundo. Talvez deveria). Eu não posso lê-los em outros aparelhos (fora da minha conta Amazon) ou emprestar para o Kindle de algum amigo, como eu faria com um livro físico. Eu apenas sou “dono” de uma licença, que permite que eu tenha aquele livro no Kindle. Se excluo minha conta na Amazon ou num cenário extremo em que a empresa não exista mais, todo o conteúdo comprado e pago, vai desaparecer. Isso já acontece em casos de editoras que retiram os ebooks de circulação (há alguns dias, algum autor ou editora sumiu com um que tinha no Kindle. Não sei qual, já que apenas apareceu um pop-up dizendo que um livro foi deletado. A Amazon não disse qual). Quem os comprou, perdeu o acesso a eles. Isso é bizarro, mas não tanto como a Amazon sabe de todos os meus (e seus) hábitos e preferências de leitura (que é o mais valioso para eles).

Eu costumo ler muita coisa distinta no Kindle. Vez ou outra algum clássico – se eu não tiver o livro físico em edições da Penguin ou da Antofágica –, muitos YA, ficções, livros e contos independentes no Kindle Unlimited, quadrinhos e por aí vai. Obviamente, a Amazon tenta me empurrar recomendações de livros que eles acham que irei me interessar. Mas para uma empresa que tem meus dados sendo processados por anos – e que me mantêm nela por pura conveniência –, eles deveriam saber que eu nunca me interessaria por qualquer livro que tenha CEO no nome ou qualquer livro inspirado em 50 Tons de Cinza. Aquela velha dinâmica de dono da empresa e empregada, só para dar um exemplo básico. Nem vou entrar no ponto das recomendações de conteúdo extremamente erótico que aparecem na tela inicial do Kindle. Talvez exista uma forma de filtrar o que deve ser recomendado, confesso que só tive esse pensamento enquanto escrevo esse post. Mas de qualquer forma, melhore, Amazon.

É inegável que o Kindle é referência de e-reader no Brasil. Já virou sinônimo da categoria, assim como falamos Bombril, Gillette, Cotonetes e uma infinidade de marcas que se tornaram o nome do produto. A falta de concorrentes sendo vendidos no país faz o Kindle (e a Amazon) nadar de braçada no segmento. Quer um dispositivo de leitura? Tem pelo menos cinco modelos de Kindle diferentes para escolher. Quer comprar um ebook? Compre na Amazon. Ainda que existam outras lojas, como Play Livros, Kobo (sim, ainda operante), Apple Books e iniciativas como Skeelo e Ubook, nenhuma está tão marcada na cabeça de leitores como a Amazon está.

Ainda que muita gente baixe livros em sites paralelos gratuitamente, a gigante de compras vai continuar sendo referência. Afinal, muito provavelmente foi comprado um Kindle para essas pessoas lerem os ebooks de maneira mais confortável que um celular ou tablet (promoção de Kindle é sempre esperada em certas datas e não é difícil ver muita gente comprando pelo menos o modelo mais barato). Fora que ninguém aguenta ver uma promoção de ebooks baratinhos por menos de R$5,00 (perfis de promoção nas redes sociais bombam com isso) ou uma assinatura do Kindle Unlimited de 3 meses por R$1,99 (o valor fica nos trend topics do Twitter por dias).

Se num futuro tivéssemos outros e-readers sendo vendidos no Brasil, eu facilmente testaria algum modelo do Kobo. São modelos bem interessantes, com um design amigável e funcionalidades tão boas quanto o Kindle. Perderia em alguns pontos, como promoções e títulos independentes interessantes que vez ou outra aparecem. Provavelmente sentiria falta disso, me fazendo ter pelo menos o aplicativo do Kindle em algum lugar para acompanhar esses dois exemplos. Como o cenário de concorrentes aparecendo é praticamente inexistente num futuro próximo, continuo com meu Kindle. Firme e e forte, lendo de tudo. É o que vale. Refém ao conforto do dispositivo, mesmo querendo novas alternativas a ele.

Atualização 06/01/2022: Meu Kindle quebrou na virada do ano e precisei comprar outro leitor de ebooks, pois não ia aguentar ficar sem. Acabou sendo o novo Kindle 🤷

Essa postagem acabou ficando sem sentido na minha cabeça. Mas vai continuar postada aqui.

#falandosozinho #tecnologia