#002181 – 19 de Maio de 2025
Em seis anos, a política em Portugal mudou muito. Nunca Abril foi tão urgente, nunca no meu tempo de vida foi tão urgente unirmo-nos, para assegurar a liberdade de todos.
Em seis anos, a política em Portugal mudou muito. Nunca Abril foi tão urgente, nunca no meu tempo de vida foi tão urgente unirmo-nos, para assegurar a liberdade de todos.
Garranos a dormir, a pastar no meio da aldeia, ao passarmos por eles. Um café no Abocanhado, com aquela paisagem impressionante. De Germil até Campo do Gerês há muita água, cabritos a comer hortelã, paisagem colorida de urze, giestas, tojo, miosótis. Nevoeiro, tempo mais fresco, sandes de salpicão e manteiga de amendoim, sorrisos cansados.
Caminhamos de Lindoso a Germil. A serra é um local em que a teoria se dissolve, a política emudece, a filosofia cede passagem. Custam, aos pulmões, aos pés, aos joelhos, estes 19 quilómetros. Mas alimenta a alma este esforço partilhado com amigos que fazem o mesmo caminho, o mundo natural tão evidentemente incluindo a nossa presença, sem esperar que sejamos seus zeladores nem reparar especialmente em nós. A felicidade anda nas vizinhanças.
As minhas férias continuam, mais um fim-de-semana. O meu lazer contrasta com o fim do mundo. O conforto relativo da minha vida é um privilégio. Sem culpa mas um sentido de urgência, já não me consigo alhear (como dantes) do contexto político do meu país, do meu planeta.
Votei antecipadamente e escrevo sobre isso tardiamente. A própria democracia parece um anacronismo. É desolador tanta falta de memória histórica. Teremos décadas interessantes para viver, a somar o perigo dos extremistas políticos às alterações climáticas, a xenofobia às crises migratórias, a desigualdade social ao desprezo pelas liberdades civis. Interessantes e perigosas.
Depois da invenção do Guitolão, ressuscita o Guitarrinho. A música popular está viva e em mutação.
Com a democracia a perder fãs, cada eleição começa a parecer derradeira. Que saudades de quando a política era aborrecida e previsível.
Estou orgulhoso do meu pai. Começou a fazer exercício no ginásio, para reduzir peso e melhorar a saúde e a mobilidade. Oito décadas de experiência neste planeta e ainda é capaz de nos surpreender.
A realidade descreve-se com ficção. O passado constrói-se com ensaio. O futuro próximo é a banha da cobra que a política vende. E a religião quer curar o sofrimento com eternidade. Já a escrita faz isto: inventa mentiras plausíveis. Resta-nos, nos interstícios da linguagem, a bondade de que sejamos capazes, o espanto que nos deixe com curiosidade do que vem, um sorriso inesperado de alguém que repara em nós.
Deixarmos o software a falar consigo mesmo. Usarmos assistentes virtuais que respondam a scam mail e solicitações legítimas, resumos redigidos por chatboxes. Androides a vender internet porta a porta atendidos pelos robôs domésticos. E nós a cozinhar uns para os outros, a nadar no mar, a pedalar. Ensinarmos às crianças como se constroem papagaios de papel e com elas reaprender a brincar. Batermos à porta dos amigos e na rua reconhecermos vizinhos. Ou então, a selvajaria digital, o saque dos nossos dados pessoais, o tecnofeudalismo habitual.