Kroeber

#001656 – 18 de Março de 2024

A editora Ripple Music tem no seu catálogo uma banda chamada Nyctophillia, palavra que o Google me diz ser a predilecção pela escuridão. Outra banda da mesma editora tem um álbum de nome Nyctophobic. Não é exatamente uma contradição. Tal como no cinema de horror, no imaginário do heavy metal a repulsa e a atração são duas forças simétricas de uma mesma tensão. Na verdade, quem mais se sentirá atraído pela escuridão é quem dela tem medo.

#001655 – 17 de Março de 2024

Os YOB lançam no Bandcamp a Demo com que tudo começou há 24 anos. Eu recomeço a aprender a andar de surfskate. Escutei a banda americana ao vivo quando vivia em Atenas. Nessa altura pegava na Halfbike ou nos patins e ia até ao estádio olímpico, que ficava a umas 6 paragens de metro da zona onde vivia. Havia quem andasse de skate e longboard. O espaço era óptimo para rodas. E o tempo perfeito. A vida nunca tem ao mesmo tempo as coisas que só o envelhecimento nos mostram ser as nossas favoritas. Temos de mudar, para ver com outros olhos o que lembramos. É sempre tarde e nunca é tarde.

#001654 – 16 de Março de 2024

O Trip Hop envelheceu muito bem. Continua intenso e terno e sombrio e cheio de groove.

#001653 – 15 de Março de 2024

Escreve Susan Neiman em “Left Is Not Woke”:

I am not an ally. Convictions play a minor role in alliances, which is why they are often short. If my self-interest happens to align with yours, for a moment, we could form an alliance. The United States and the Soviet Union were allies until the Nazi regime was defeated. When the U.S. decided its interests lay in recruiting former Nazis to defeat communism, the Soviet Union turned from ally to enemy. What interest led millions of white people into plague-threatened streets to shout “Black Lives Matter”? This was no alliance, but a commitment to universal justice. To divide members of a movement into allies and others undermines the bases of deep solidarity, and destroys what standing left means.

E escreve Franco “Bifo” Berardi em “After the Future”:

Connectivity and precariousness are two sides of the same coin: the flow of semiocapitalist production captures and connects ellularized fragments of de-personalised time; capital purchases fractals of human time and recombines them in the web. From the standpoint of capitalist valorisation, this flow is uninterrupted and finds its unity in the object produced; however, from the standpoint of cognitive workers the supply of labor is fragmented: fractals of time and pulsating cells of labor are switched on and off in the large control room of global production.

Quando li a passagem de Neiman lembrei-me de imediato do livro de Franco Berardi. Cada um dos autores marxistas fala de coisas diferentes, nestes livros. Mas um e outro têm uma visão semelhante da acção colectiva. Para Susan Neiman não é suficiente sermos aliados, é preciso o comprometimento que vem apenas quando assumimos a causa como nossa. Para Berardi, é desoladora a ideia de sermos átomos indiferenciados, numa sociedade que nos isola, e em que nos conectamos como peças semelhantes de uma máquina que nos ultrapassa, que nos instrumentaliza e controla. Franco “Bifo” Berardi diz que é preciso a conjunção, não apenas a conexão. Escreve o autor italiano:

Conjunction is becoming-other. In contrast, in connection each element remains distinct and interacts only functionally. Singularities change when they conjoin; they become something other than they were before their conjunction. Love changes the lover and a combination of a-signifying signs gives rise to the emergence of a meaning that does not exist prior to it. Rather than a fusion of segments, connection entails a simple effect of machinic functionality. In order to connect, segments must be compatible and open to interfacing and inter-operability.

#001652 – 14 de Março de 2024

Chove muito, o vento é gelado. Tenho saudades do skate. E das viagens de bicicleta. Mais um pouco de chuva, vento um pouco mais intenso e começam os estragos. Inundações, derrocadas. Mais ainda e começam pessoas a morrer. Numa escala de intensidade estas variações ocupariam um espaço minúsculo. Há ainda espaço para oscilações muito mais violentas. A zona em que a vida humana pode ser não só viável mas boa é minúscula. E o futuro, tudo indica, fará o clima funcionar mais e mais fora dessa zona que se pensou garantida e estável. E sim, é culpa humana.

#001651 – 13 de Março de 2024

“Euphoria” é talvez a intersecção entre o quase nihilismo adolescente das personagens de Larry Clark e o benigno drama que acaba sempre bem dos adolescentes de “Sex Education”. Funciona. Funciona muito bem.

#001650 – 12 de Março de 2024

Que saudades de quando não prestava atenção às notícias.

#001649 – 11 de Março de 2024

“Venice” é de uma ternura imprecisa, calorosa, um fumo de lareira a queimar os últimos vestígios de melancolia. E neste álbum de Fennesz, que faz em 2024 vinte anos, surge ainda a voz grave e etérea de David Sylvian, em “Transit”. Conjunto de canções que acompanha todos os moods e paisagens, todos os climas, que implanta uma paisagem interior, uma diluição de todas as danças.

#001648 – 10 de Março de 2024

A música d'“A garota não” magoa-me. É uma dor boa, imensa e vulnerável. Uma sensação semelhante a estar vivo, ou ao acto de olhar para cantos do meu íntimo algo esquecidos.

#001647 – 09 de Março de 2024

Trabalho em ritmo acelerado. Chuva em fôlegos surpreendentes. Fleet Foxes, Volcano Choir e Beirut a sossegar a alma.