view#002024 – 12 de Dezembro de 2024
Aos 13 anos, comecei por escrever crónicas. Isso parou quando li um livro do Miguel Esteves Cardoso e, por comparação, percebi que o fazia muito mal. Virei-me para a poesia até ler os Poemas Completos, do Herberto Helder, aos 19 anos. Há muito tempo que escrevo ficção, hábito de que não me consigo livrar, por mais que leia histórias, sobretudo de ficção científica. Não sei o que isto diz sobre a minha persistência. Ou sobre a minha sanidade.
view#002023 – 11 de Dezembro de 2024
Trabalho de manta nos joelhos. Escuto Beauty Pill e sacudo os ossos.
view#002022 – 10 de Dezembro de 2024
Deixo aqui uma das muitas sinopses de potenciais contos que não escrevi e que nunca escreverei. Sou menos que um escritor, sou meramente um anotador de ideias. Sou o que recolhe sementes e as coloca no frigorífico, em vez de cuidar da planta e fazê-la florescer. E chego a confundir pedras com sementes.
A prisão dos sonhos (17 de Outubro de 2022)
Um cientista louco inventa uma máquina que aprisiona pesadelos, que os torna realidade material.
Tudo começa a correr mal, enquanto ele se vicia no efeito da máquina e consome as vítimas, deixando-as sem capacidade de sonhar. Uma criança infeta a máquina, libertando os pesadelos, com uma gota de sonho.
view#002021 – 09 de Dezembro de 2024
Reler uma história passados anos é descobrir o que não era possível saber enquanto escrevia. No conto Mundo do Fim, algo óbvio só se tornou saliente com a minha releitura hoje: a narrativa tem um protagonista ausente. Não lhe conhecemos pensamentos nem acções nem ponto de vista. Faz sentido que tenha escrito dessa forma, porque queria intensificar o que está a acontecer à volta do protagonista e mostrar como o mundo se vira contra ele, mas na altura não pensei nisso.
view#002020 – 08 de Dezembro de 2024
Vou talvez (re)começar com um inventário: que histórias estão acabadas, se haverá algumas que devo terminar. Quais ainda quero publicar, quais ainda tenho fôlego para escrever.
view#002019 – 07 de Dezembro de 2024
Dois universos habitam a minha imaginação e muitas centenas de páginas. Num deles, há uma diáspora humana, que habita um sistema estelar que não o nosso. O outro é uma terra num futuro longínquo, pós catástrofe ecológica, em que a humanidade se reconstrói com tecnologia rudimentar. O tempo de um e outro é o mesmo. Ao mesmo tempo (que os eventos de um e outro são narrados) há humanos descendentes dos que ficaram e há os descendentes dos que partiram. Não sei se alguma história fará uma ligação que torne isso evidente. Há muitas dezenas de personagens que vivem comigo há anos, ainda esperançosas que os seus mundos cresçam e que as suas vidas se desenvolvam. Algumas das suas histórias estão terminadas. Mas a maior parte é mapa desconhecido. Tanto cartografei que descurei as páginas onde estes lugares e personagens deveriam estar.
view#002018 – 06 de Dezembro de 2024
Nicolau Santos estreou-se como romancista aos 70 anos. Eu há quase 20 anos que não acabo um único dos romances que comecei. Precisarei ainda de mais 20?
view#002017 – 05 de Dezembro de 2024
É muito frequente ficar embaraçado com a má qualidade de textos que reencontro e que escrevi há alguns anos. Mas há algo ainda pior: reler uma história inacabada, incompleta há vários anos, cuja escrita não me envergonha.
view#002016 – 04 de Dezembro de 2024
Ler de menos. É sempre de menos, por mais que leia. Ler mal, sem o necessário silêncio, sem tomar notas adequadas, sem contexto nem capacidade de interpretação suficientes, sem grandes referências, sem rumo, quase mesmo sem propósito. Leio porque não ler seria pior, não ler seria deserto insuportável, pouco mais do que não respirar. Seria sufocar na minha própria ignorância que assim, lendo, ao menos ganha fôlego e tamanho. Na metáfora de Wheeler, vivemos numa ilha, rodeados pelo mar da nossa ignorância. E à medida que a nossa ilha de conhecimento aumenta, aumenta também o litoral da nossa ignorância.
view#002015 – 03 de Dezembro de 2024
O teorema do macaco infinito sugere que um macaco a martelar de forma aleatória uma máquina de escrever para sempre acabaria por escrever todas as as combinações de letras possíveis, incluindo, por exemplo, as obras completas de Shakespeare. N' A Biblioteca de Babel, do Jorge Luis Borges, o narrador vive num universo em que cada pessoa vive numa sala com quatro paredes cobertas de prateleiras de livros. Os livros, vamos descobrindo, contêm todas as combinações possíveis das letras do alfabeto. Este conto de Borges é um exemplo de como funciona a construção de uma narrativa de ficção científica.
Se o ponto de partida for o teorema do macaco infinito, a ficção centrada no enredo cria uma crise para o macaco, fá-lo passar por peripécias e depois tem um desfecho. Já a ficção científica constrói um universo com a premissa, onde as personagens viverão. Em alguns casos, basta a construção, nem é necessária narrativa, como n' As Cidades Inviséis de Calvino. Noutras, existe a construção e também o enredo, como em Changing Planes, da Ursula K. Le Guin.